Clipping 007

A Embraer na encruzilhada
A empresa deve registrar em 2007 o melhor ano de sua história. Mas os dias de crescimento supersônico podem estar no fim

A Embraer, terceira maior fabricante de aviões do mundo, vive um momento paradoxal. Neste ano, a empresa atingirá aquele que deve ser o melhor resultado de sua história de 37 anos. Se tudo correr de acordo com as previsões, a Embraer entregará até dezembro pelo menos 160 aviões comerciais, crescimento de 60% sobre as vendas de 2006. De acordo com os cálculos dos analistas, seu faturamento vai ultrapassar os 5 bilhões de dólares. Os números são o ápice de uma trajetória de crescimento fulminante. Desde 1998, as vendas da Embraer se expandem aos saltos, numa média de 65% anuais. Mas em São José dos Campos, cidade no interior de São Paulo onde fica a sede da companhia, esse desempenho vem sendo comemorado com certa dose de preocupação. O motivo é uma percepção que ganha força entre investidores e especialistas: a de que o ano de 2007 deve ser uma espécie de divisor de águas, que marcará um novo ciclo na história da Embraer. Os anos de crescimento frenético dificilmente se repetirão. “As projeções para a expansão da Embraer são de cerca de 10% ao ano já a partir de 2008”, diz Luiz Olimpio Campos, analista de aviação do banco de investimentos Credit Suisse.

As origens da encruzilhada em que a Embraer se situa podem ser encontradas em seu próprio sucesso. No final dos anos 90, os executivos da empresa decidiram investir em um mercado praticamente inexplorado pelos concorrentes, os jatos com capacidade entre 70 e 120 lugares. A estratégia deu certo, incrivelmente certo — mais que isso, transformou o mercado de aviação regional no mundo. Com o movimento, a Embraer deixou para trás sua maior concorrente, a canadense Bombardier, com quem disputou por uma década o mercado de aviões pequenos (com no máximo 50 lugares). A má notícia é que, justamente pelo sucesso da estratégia, esse mercado se esgotou. Há pouco espaço para o lançamento de novos produtos. O executivo Maurício Botelho, que presidiu a empresa desde sua privatização até o mês passado, afirmou que seria uma loucura fabricar aviões maiores do que o EMB 195, com capacidade para transportar até 118 pessoas. A razão é prosaica. Um jato maior incomodaria a americana Boeing e a francesa Airbus, as maiores fabricantes do mundo. “Competir com Boeing e Airbus é pouco recomendável”, disse Botelho antes de deixar o comando da companhia. (Em abril, ele foi substituído por Frederico Fleury Curado na presidência.)

A falta de espaço é o grande problema da Embraer. Ao mesmo tempo que se vê limitada para crescer no mercado das maiores potências da aviação civil, a empresa começa a ser incomodada em seu mercado cativo. A Bombardier lançou um avião de 100 lugares. E fabricantes russos e chineses também já anunciaram que vão entrar na briga. Diante dessa sinuca estratégica, a empresa começou a buscar alternativas. Seus novos lançamentos serão concentrados em dois segmentos. Um deles é o mercado de jatos executivos, que responde por 15% de seu faturamento. Foram anunciados recentemente novos projetos nessa área. Os principais são os Phenom 100 e 300 (com capacidade para até nove passageiros) e o grandalhão Lineage 1000, um dos maiores jatos executivos do mundo. O lance mais ousado veio em abril, quando a Embraer anunciou que pretende entrar com força redobrada na aviação militar, hoje uma atividade marginal, responsável por apenas 6% de suas receitas. A companhia estuda fabricar um avião militar de transporte com capacidade de 19 toneladas para concorrer com o consagrado Hercules C 130, da americana Lockheed Martin, um titã que domina o mercado há cerca de 50 anos. De acordo com Luiz Carlos Aguiar, vice-presidente da Embraer para a área de defesa, há um mercado potencial de 700 aviões nessa categoria.

AS DUAS NOVAS APOSTAS da Embraer são consideradas arriscadas. Tome-se o mercado de defesa. Seu tamanho é indiscutível: só o governo americano pretende investir 628 bilhões de dólares em defesa no ano que vem. Ocorre, porém, que a aviação militar não é regida apenas pelas regras do livre mercado. Diferentemente do que ocorre na aviação comercial, qualidade e preço não são os únicos determinantes na escolha do cliente. A própria Embraer já foi vítima disso. Recentemente, o governo americano vetou a venda de suas aeronaves militares para a Venezuela e o Irã. Como boa parte dos componentes usados nos aviões de defesa da Embraer tem origem americana, os Estados Unidos têm direito a esse veto. Em 2003, a empresa venceu uma licitação do Exército americano para fornecer aviões de vigilância, em parceria com a Lockheed Martin. Mas foi tirada do jogo depois que as autoridades militares mudaram as especificações do projeto, o que inviabilizou o uso do jato brasileiro.

No segmento de aviação executiva, aquele que a Embraer pretende atacar com mais consistência, o cenário também é complexo. Aqui, o problema é justamente o livre mercado. Pelo menos sete empresas disputam esse mercado — as americanas Boeing, Cessna, Gulfstream e Raytheon, as francesas Airbus e Dassault e a canadense Bombardier. Como em todo o mercado de luxo, uma marca glamourosa tem grande apelo na hora de vender um jatinho. E a Embraer, ao menos por enquanto, não tem esse apelo — é como imaginar a coreana Hyundai iniciando a produção de carros esportivos de luxo para competir com Porsche, Jaguar e Ferrari. Apesar dos obstáculos à frente, a situação da Embraer não pode ser considerada ruim. Longe disso. A carteira de pedidos está abarrotada de encomendas e seus jatos regionais são considerados os melhores do mundo. O grande desafio de seus executivos, Curado à frente, é encontrar uma nova rota para a empresa — agora que os tempos de crescimento supersônico ficaram para trás.

Sobre Wagner Artur Cabral

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